As mudanças no financiamento imobiliário com recursos do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) anunciadas pela Caixa Econômica Federal, na segunda-feira, foram bem recebidas pelo setor, embora tenham impacto limitado, e haja a avaliação que faltam outras medidas de estímulo, como ampliação do limite do preço do imóvel em que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pode ser utilizado. A principal medida divulgada pela Caixa foi a ampliação do teto do valor da unidade financiada pelo SFI de R$ 1,5 milhão para R$ 3 milhões, incentivando a venda de unidades dessa faixa em estoque.
A ampliação do limite pode contribuir, por exemplo, para a comercialização de parte do estoque do Jardim das Perdizes, maior empreendimento da Tecnisa. Cerca de 20% das unidades lançadas no Jardim das Perdizes, nessa faixa, ainda está em estoque. Parte dos distratos de unidades com valor entre R$ 1,5 milhão e R$ 3 milhões poderia ter sido evitada, disse o presidente da Tecnisa, Meyer Nigri, se a medida tivesse sido anunciada anteriormente, com taxa de juros inferior à dos bancos privados. A Caixa ainda não informou qual será a taxa cobrada.
De acordo com Nigri, a Tecnisa vai continuar a focar lançamentos na baixa renda, segmento em que o mercado tem reagido melhor. A companhia está desenvolvendo, principalmente, unidades de até R$ 400 mil, que podem ser enquadradas na linha PróCotista do FGTS. “Não significa que não faremos lançamentos nos outros segmentos”, diz o executivo. Ainda falta a Tecnisa lançar 60% do Jardim das Perdizes.
Na avaliação do empresário, as mudanças anunciadas pela Caixa dariam impulso ao setor se fossem somadas à elevação do limite do valor do imóvel em que o FGTS pode ser usado. “Os limites do uso do FGTS, R$ 750 mil em São Paulo e R$ 650 mil em outras capitais, é muito baixo”, afirma Nigri.
Os imóveis mais caros da Rodobens Negócios Imobiliários (RNI) são vendidos por valor próximo a R$ 1,5 milhão e já eram, portanto, contemplados por recursos do SFI. O aumento do limite do financiamento é considerado positivo pelo presidente da companhia, Mauro Pereira Bueno Meinberg, mas não muda a perspectiva do setor no curto prazo e “não tem impacto relevante no setor neste momento”, na sua avaliação.
O efeito seria maior, segundo Meinberg, se houvesse mudanças nos critérios de risco dos bancos. Isso depende de perspectiva de melhora econômica refletida na renda e em financiamento de fatias maiores do imóvel e com taxas de juros mais baixas, de acordo com o presidente da Rodobens. Na opinião do executivo, o mercado imobiliário será destravado quando houver mudanças relevantes na confiança do consumidor e do empresário.
Para o diretor financeiro e de relações com investidores da EZTec, Emilio Fugazza, o anúncio de que a Caixa está “voltando à cena” ajuda a melhorar a confiança do consumidor. “Quando a Caixa volta ao mercado promove um reequilíbrio de taxas”, afirmou o executivo. Segundo Fugazza, os imóveis para as classes média/alta e alta são os que estão vendendo. “Desde maio, há uma percepção do consumidor de que as coisas começam a melhorar”, diz. Na prática, o impacto do anúncio ocorre, principalmente, na venda de estoques, conforme o executivo.
O presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Rubens Menin, afirma que a entidade “tem lutado, há bastante tempo, para mudar as condições de financiamento para o médio e o alto padrões”. “Todo aumento no leque de opções para o mercado é positivo. A Caixa tem o racional do funding [fonte de financiamento] para fazer isso. Caso contrário, não faria”, disse Menin.
A alta do limite do financiamento nos moldes do SFI não vai mudar o cenário do setor “do dia para a noite”, segundo o copresidente da MRV Engenharia, Rafael Menin, mas é vista como positiva. “Não deixa de ser uma notícia boa. A Caixa é um banco com muita agilidade e taxas competitivas”, diz o executivo da MRV. A companhia atua no segmento de baixa renda.
Procurados, os bancos de grande porte disseram que, no geral, não há mudanças na estratégia de financiamento imobiliário após o anúncio feito pela Caixa. Por meio de sua assessoria de imprensa, o Bradesco informou que, atualmente, desde que o departamento de crédito avalie que o crédito não compromete mais do que 30% da renda do cliente, não há limite de valor total para a unidade a ser financiada embora o site da instituição aponte teto de R$ 5 milhões para imóvel residencial. O banco financia até 80% do valor do imóvel por até 30 anos a uma taxa de 12,5% ao ano.
O Itaú Unibanco diz que está acompanhando as mudanças no mercado. “Por enquanto, nada muda em nossa estratégia para financiamento imobiliário”. No banco, é possível financiar imóveis a partir de R$ 134 mil sem limite máximo. O percentual de financiamento é de até 75% do valor do imóvel, com valor mínimo de R$ 100 mil, com prazo máximo de 360 meses. O Itaú Unibanco não informa taxas.
O Santander também indica que não há limite para o valor do imóvel a ser financiado, e o teto já é de até 80%. O mesmo percentual se aplica a imóveis novos, cuja construção tenha sido financiada pelo banco. As taxas de juros giram a partir de 11% no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e de 11,7% no SFI. Fonte do setor avalia que, sem mais detalhes sobre a operação da Caixa, a percepção é de um esforço do banco público para divulgar o que outras instituições já oferecem em condições semelhantes, mas talvez sem clientela que atenda ao perfil exigido.
O Banco do Brasil (BB) também informa que já financia imóveis de até R$ 5 milhões, com máximo financiável de 80% e juros de 12,29% a 12,41% ao ano mais taxa referencial (TR).
Fonte: Valor, 20 jul. 2016